FOLHA DE S.PAULO *
SÁBADO, 27 DE MAIO DE 2023 9
Conheça 8 livros que ensinam crianças a se proteger
'NÃO ME TOCA,
SEU BOBOCA'
Andrea Taubman, editora Aletria,R$ 32,20, 40 págs.
Uma história delicada,
contada de forma lúdica e com rimas por meio da jornada de Ritoca e seus amigos para escapar de uma situação difícil. Sugerido para crianças de 4 a 8 anos.
“PIPO E FIFI'
Caroline Arcari, editora Caqui, R$ 44,90, 32 págs.
Explora a diferença entre toque afetivo e toque abusivo de forma compreensível para crianças bem pequenas
(a partir de 3 anos). A autora tem vários outros livros publicados sobre consciência corporal e prevenção de violência sexual —entre eles, “Que legal o abraço de Cacau”
e “Ceci Tem Pipi?”.
'GOGÔ, DE ONDE VÊM OS BEBÊS?
Caroline Arcari, editora Caqui,
R$49,90, 36 págs.
Conta a história de Gogô,
uma cegonha que ensina aos pequenos leitores conceitos sobre a origem dos bebês e valores como respeito, consentimento e maturidade. Sugerido para crianças a partir de 5 anos.
'SEGREDO,
SEGREDÍSSIMO'
Odívia Barros, Geração Editorial,R$ 32,90, 32 págs.
Conta a história de Adriana,
uma menina triste que tem um segredo e muda sua vida para melhor ao seguir o conselho de sua amiga Alice. Sugerido para crianças a partir de 6 anos.
'MEU CORPO,
MEU CORPINHO"
Roseli Mendonça, editora Matrescência, R$ 54, 32 págs.
Um livro bonito e divertido que aborda integridade física,
privacidade e proteção,
com ensinamentos sobre partes íntimas, o poder de dizer não e a importância do diálogo com um adulto de confiança. Sugerido para crianças de 4a 6 anos.
“TUCA E JUBA -
ENSINANDO CONSENTIMENTO PARA ADOLESCENTE'
Julieta Jacob, editora Caqui,
R$38,70, 36 págs.
Voltado para adolescentes e crianças maiores (a partir de 12 anos), o livro convida a pensar sobre consentimento, autoestima e relações saudáveis, com uma linguagem visual voltada para a geração que nasceu na internet e nas redes sociais.
LEILA Tino Freitas, editora Abacatte,
R$55,50, S2 págs.
Conta a história de Leila,
um filhote de baleia jubarte que vive assombrada pelo assédio de seu vizinho, o Barão, até que encontra a sua voz para se libertar do constrangimento e do medo. Recomendado para crianças a partir de 8 anos.
'O PODER DE ME PROTEGER"
Mariana Motta, LC Editorial,
R$60,92 págs.
Traz quatro histórias para crianças e um guia para os adultos, estimulando o diálogo sobre conceitos como consentimento,
limites corporais,
partes íntimas, toques seguros e inseguros,
segredos e confiança.
Flávia Mantovani Leia mais sobre a escritora Caroline Arcari nas págs.10e 11
6º edição - violência sexual infantil seminários Policial civilem sala da Casa da Criança e do Adolescente em Fortaleza (CE) -sarbas Oliveira /Folhapress Centros reúnem órgãos de proteção sob o mesmo teto Objetivo é facilitar denúncia, mas faltam recursos para expansão do modelo Pedro Lovisi e Marcel Rizzo SÃO PAULO E FORTALEZA A falta de comunicação entre os órgãos da rede de proteção à criança e ao adolescente prejudica o atendimento às vítimas. Em vários casos, é comumuma instituição encaminhar a pessoa que denunciou uma agressão para outro órgão e assim sucessivamente,
desestimulando a denúncia.
Para diminuir essa desconexão, alguns estados vêm desenvolvendo centros de integração que incluem Conselho Tutelar, Polícia Civil, Instituto Médico Legal, Ministério Público e Secretaria Municipal de Saúde. Nesse modelo, os órgãos atuam no mesmolocal econversam entresi ao receberem uma denúncia.
Em Fortaleza por exemplo, a Casa da Criança e do Adolescente reúne seis deles, além de contar com psicólogos que atendem as vítimas. O centro é gerido pelo governo do Ceará.
O primeiro atendimento é como adulto responsável pelo menor —nessa parte, Os profissionais buscam entender a situação, enquanto uma cuidadora acompanha a criança na brinquedoteca da casa. Segundo os funcionários, a maioria dos casos é relacionada a conflitos familiares, que requerem encaminhamento ao Conselho Tutelar.
Mas, sea denúncia for mais grave, acriança é encaminhada para a Perícia Forense do Estado do Ceará, onde fará o exame de corpo de delito.
Simultaneamente, oresponsável por ela registra o boletim de ocorrência na Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente eaciona um advogado da Defensoria Pública —tudo no mesmo lugar.
Em caso de flagrante, o suspeito também é ouvido no centro, mas em outra ala do espaço, para não ter contato com a vítima. Às sextas-
“feiras, o centro abriga as audiências de casos já aceitos pela Justiça.
“Nomesmo espaço, há profissionais que fazem a proteção e a responsabilização em casos de violência contra crianças e adolescentes. Porque antes as pessoas precisavam ir a vários locais diferentes para fazer a denúncia, para realizar um procedimento de perícia e para prestar um depoimento. Isso gerava muita desistência, até porque muitas não têm dinheiro para esses deslocamentos”, explica Silvana Bezerra da Silva Torres,
coordenadora da casa.
Ocentroiniciou suas operações em junho do ano passado e, desde então, realizou 12.921
atendimentos, sendo 1153 relacionados a violências graves,
como estupro. A estrutura fica em uma casa de dois andares em um bairro de classe média baixa, a seis quilômetros do centro de Fortaleza.
Deacordo comlevantamento da ONG Childhood Brasil feito em2017,há ao menos outrosseis centros semelhantes no Brasil —Porto Alegre
Belém Teresópolis
Rio de Janeiro, Brasília e Vitória da Conquista O último, criado em 2015, éreferência no país. O centro é administrado pela prefeitura e reNo mesmo espaço há profissionais que fazem a proteção e a responsabilização em casos de violência contra crianças e adolescentes Silvana Bezerra da Silva Torres coordenadora da Casa da Criança e do Adolescente de Fortaleza úne 12 órgãos do Executivo e do Judiciário, além do Conselho Tutelar.
Devido à falta de metodologia única nos atendimentos,
cada centro atua de forma diferente na escuta das crianças e dos responsáveis.
“Não bastaintegração física.
São necessários uma integração institucional e um protocolo unificado no país”, afirma Cândida Magalhães, advogada que atua no enfrentamento à violência doméstica e familiar.
Em junho do ano passado,
o governo do então presidente Jair Bolsonaro editou uma portaria que incentivava estados e municípios a implementarem o modelo, mas sem apontar a origem dos recursos para a construção desses centros. Na prática, isso inibia estados e municípios de criaremsuas próprias estruturas.
No último dia 18, em cerimônia oficial sobre a exploração sexual infantil, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania lançou um guia que aponta como esses espaços devem ser mobiliados e como os órgãos devem atuar. O documento, formulado pela Childhood Brasil, havia sido encomendado pelo Executivo em 2020.
Além disso, a pasta anunciou investimento inicial de R$ 2,5 milhões para equipar os centros e garantir a escuta protegida e segura de crianças e adolescentes. O ministério não deu prazo nem detalhes sobre como a quantia será enviadaaos estados e municípios.
O valor anunciado é inferior ao necessário para a construção dessas estruturas por todo o país. Só no Ceará, por exemplo, o governo estadual investiu R$ 1,4 milhão em reforma, mobiliário e equipamentos. Além disso, a administração paga R$ 15 mil por mês para ter o imóvel.
Já em Mato Grosso do Sul,
onde Sophia de Jesus Ocampo, de 2 anos 7 meses, foi assassinada depois de seu pai acionar a rede de proteção à criança por sete vezes, 0 governo estadual busca a doação de um terreno que pertence à União, em Campo Grande,
onde o centro funcionaria.
“A União poderia também entrar com uma parte dos recursos para a construção”,
afirma Roberto Gurgel, delegado-geral da Polícia Civil do estado. A estrutura, de acrodo coma Secretaria de Justiça e Segurança Públicalocal, deve ficar pronta em um período de três a cinco anos.
Atuação de psicólogos em depoimentos gera embate são PAULO Uma menina de oito anos é estuprada pelo padrasto. A mãe dela vai à delegacia e registraum boletim de ocorrência. Lá, uma psicóloga é escalada para conversar coma criança.
Nesse caso hipotético, a criança se sente confiante e contaoqueaconteceu. Só que que a sala onde estão apenas as duas é cercada de câmeras e,
em outro ambiente, o delegado assiste todaa conversa. Ele pode inclusive orientar a psicóloga por meio deum ponto eletrônico a fazer determinadas perguntas.
“Isso fere a autonomia e o sigilo profissional, porque é a psicóloga quem deve definir como vai fazer as perguntas.
Mesmo se a responsável autorizar terceiros, não está correto” afirma Marina Poniwas,
do CFP (Conselho Federal de Psicologia) e vice-presidente do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente).
Já Reginaldo Alves Júnior,
psicólogo jurídico do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, considera a metodologia adequada. Segundo ele, o argumento de que talsituação fere o sigilo profissional é levantado por psicólogos clínicos. “O profissional que atua no sistema de Justiça pode fazer suas avaliações einformar aautoridade competente”
A discussão ganhou força depois de 2017, quando o então presidente Michel Temer
(MDB) sancionoulei que regulamenta a escuta de crianças vítimas de violência.
Segundo o texto, o depoimento especial é realizado pela autoridade policial ou judiciária uma única vez como produção antecipada de provas. O dispositivo também diz que o procedimento deve ser feito emlocal que garanta acolhimento e privacidade.
Especialistas que ajudaram emsuaelaboração defendem que alei visa acelerar investigações e facilitar a responsabilização. Além disso, a gravação da conversa entrea criança e o psicólogo e a intermediação de autoridade policial ou jurídica pode diminuir a chance de que a vítima tenha que ser ouvida mais de uma vez. Caso o promotor ou o juiz queira saber a versão da criança, pode assistir ao vídeo da interação.
Sala de gravação do complexo de escuta protegida de Vitória da Conquista (BA) Divulgação Itamar Batista Gonçalves,
gerente de advocacy da Childhood Brasil e um dos articuladores da legislação, afirma que, quando o psicólogo participa do depoimento, não exerce a profissão de origem,
mas a de entrevistador forense. Assim, diz, não cabe falar em sigilo profissional.
Mas o CFP (Conselho Federal de Psicologia) não entende assim. Em 2010, sete anos antes da promulgação da lei,
a entidade proibiu os profissionais de exerceremo papel de inquiridor no atendimento desses casos. A Justiça Federal suspendeu a medida três anos depois e exigiu sua revogação em 2020.
Desde então, o CFP apenas recomenda que os profissionais não exerçam função. Para a entidade, o correto é ouviracriança por várias sessões e,a partir disso, formularum laudo técnico que subsidie a Justiça. Esse é procedimento feito por Poniwas, que também é psicóloga do Tribunal de Justiça do Paraná.
“Cabe à psicologia prestar atendimento, acolhimento,
prevenção e proteção em casos de situação de violência sexual. Mas não cabe à psicologia se preocupar coma verdade processual dos fatos. Isso é tarefa do direito”
Em meio ao impasse, Gonçalves, da Childhood, defende que, se necessário, os psicólogos sejam substituídos por pedagogos e assistentes sociais, que já atuam em vários estados.
Segundo estudo do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, mais de 70% dos entrevistadores da corte são assistentes sociais, contra 23%
de psicólogos. A lei de 2017
não define qual categoria deve exercer a função de entrevistador forense. PL
Centros reúnem órgãos de proteção sob o mesmo teto
2|24