O Tribunal de Justiça do Paraná (Tjpr) autorizou que uma moradora de Curitiba interrompa a gravidez de um feto diagnosticado com a Síndrome de Edwards, condição que impossibilita a vida extrauterina. A ação foi movida pelo Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem), da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR). O procedimento foi realizado na última sexta-feira (30/06).
Foto: Divulgação
De acordo com a DPE-PR, a mulher recebeu a confirmação da síndrome genética na 16ª semana de gestação. Com múltiplas malformações fetais graves, a médica que fazia o acompanhamento durante o pré-natal orientou pela interrupção. Mais dois profissionais confirmaram o diagnóstico e ela então buscou a Justiça.
De acordo com a defensora pública coordenadora do Nudem, Mariana Nunes, a mulher precisou recorrer ao judiciário para requerer autorização para realizar a interrupção da gestação porque a Síndrome de Edwards não foi abrangida pela decisão concedida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n° 54 do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou a possibilidade de se realizar aborto diretamente pela rede de saúde apenas em caso de feto anencéfalo.
“A despeito disso, verifica-se que, no caso em análise, a decisão do STF pode ser aplicada por analogia, uma vez que foi constatada por três perícias médicas a impossibilidade de vida extrauterina do feto”.
Após o primeiro pedido da DPE-PR, o Ministério Público posicionou-se a favor da autorização judicial para a interrupção da gestação, mas a Vara do Tribunal do Júri onde a solicitação foi feita indeferiu o pedido sob o argumento de que, apesar dos laudos médicos, era possível encontrar em pesquisas na internet matérias jornalísticas que mostravam casos, “ainda que raros”, de crianças que sobreviveram à Síndrome, o que, segundo a decisão, provaria que a condição do feto não seria totalmente incompatível com a vida.
A Defensoria então optou por recorrer da decisão da juíza.
No recurso apresentado ao Tjpr, a Defensoria alegou que, embora possam existir crianças vivas portadoras da Síndrome, neste caso em específico, além de exames de ultrassonografia morfológica e de pesquisa cromossômica, três médicos especialistas afirmam a inviabilidade de vida extrauterina, e que, perante a Justiça, a situação da gestante deve ser analisada de acordo com a singularidade do caso, de modo que o laudo médico com certificação técnica deve ser suficiente para respaldar o pedido e concessão da interrupção da gestação.
A Defensoria ainda destacou o grave sofrimento psicológico ao qual a mulher estava submetida após descobrir a condição da criança, que, segundo ela, foi muito desejada. Além disso, a demora na interrupção da gestação poderia ocasionar diversas complicações para ela, já que a gestação de fetos com anomalias graves aumenta o risco de mortalidade materna e traz complicações como a morte do feto ainda no ventre e infecções em razão da malformação. Assim, segundo o pedido apresentado pela DPE-PR, levar a gravidez até o fim nestas condições se transformaria em “um processo semelhante a uma tortura”.
“Impor a gestação de um feto inviável acarreta imenso sofrimento psíquico e emocional à mulher, que precisará conviver com uma gestação que, ao fim, resultará no parto de um natimorto. O processo sequer terminará após o parto, pois a família terá que registrar o nascimento e realizar o sepultamento deste recém-nascido, e, ainda, se dirigir a uma delegacia de polícia ou cartório para registrar o óbito. É fato que muitos pais podem optar por levar a gestação adiante, e tal escolha deve ser respeitada. Porém, igualmente respeitada deve ser a decisão daqueles que optam por abreviar esse sofrimento. A decisão que autoriza a interrupção da gestação nestes casos reconhece o direito fundamental da mulher à liberdade sobre seu próprio corpo e os seus direitos sexuais e reprodutivos como parte do direito à dignidade humana”, defende a coordenadora do Nudem.
O recurso foi apresentado ao Tribunal de Justiça do Paraná no dia 23 de junho pela defensora pública Mariana Martins Nunes e pelo defensor público David Alexandre de Santana Bezerra. Quatro dias depois, a Primeira Câmara Criminal do Tjpr deferiu a liminar e expediu, em caráter emergencial, alvará que autorizava a realização da interrupção médica da gestação.
Justiça autoriza que mulher interrompa gravidez de feto com síndrome rara em Curitiba
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