Caso envolvendo Ademar Traiano (PSD) se tornou público em dezembro de 2023, mas aconteceu em 2015, de acordo com Ministério Público (MP);
Além de Traiano, que é presidente da Alep, caso também envolve ex-deputado Plauto Miró;
Em delação premiada em 2020, empresário Vicente Malucelli revelou que pagou propina por medo de que a TV da qual era diretor sofresse represálias na Alep;
Em 2022, Traiano e Plauto formalizaram acordos com o MP admitindo ter pedido e recebido propina. A partir da confissão e multa, não foram denunciados à Justiça.
A RPC e o g1 tiveram acesso aos depoimentos e áudios que mostram e explicam a negociação de propina entre o deputado estadual Ademar Traiano (PSD), presidente da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), e o empresário Vicente Malucelli.
O pagamento aconteceu em 2015, quando Vicente Malucelli era diretor da TV Icaraí, então prestadora de serviço da TV Assembleia, e também também envolve o ex-deputado Plauto Miró (Democratas).
Nesta reportagem você vai ver:
Veja trechos dos áudios e depoimentos
Traiano e Vicente Malucelli conversam sobre pagamento de propina
Um áudio gravado por Malucelli mostra uma conversa entre ele e o deputado, na qual Traiano combina a forma do recebimento de uma segunda parcela de R$ 50 mil. Veja acima.
Traiano diz que filho dele vai receber cheque de Vicente Malucelli
Em uma das conversas gravadas por Vicente Malucelli, ele e o deputado combinam a entrega dos cheques ao filho de Traiano. Conforme as investigações, as propinas ao presidente foram pagas dentro do prédio da Assembleia Legislativa e também na casa do deputado. Veja acima.
Traiano pediu ajuda para campanha no valor de R$ 300 mil em um bilhete
Aos promotores, Vicente Malucelli contou como combinou uma reunião com Traiano e Plauto dentro da Alep. Nela, Traiano pediu ajuda para campanha no valor de R$ 300 mil em um bilhete. Veja acima.
Vicente Malucelli diz que entendeu pedido como um recado de que poderia ter contrato rescindido
No mesmo depoimento, o empresário disse que recebeu o pedido de dinheiro como um recado de que poderia sofrer retaliações da Alep, principalmente em relação ao fim do contrato com a TV Icaraí. Veja acima.
Joel Malucelli relata como soube do pedido de dinheiro por parte dos deputados
Aos promotores, Vicente Malucelli também afirmou na sequência que levou o pedido de "ajuda para campanha" no valor de R$ 300 mil ao presidente do grupo, Joel Malucelli, que é primo dele.
Juntos, os empresários combinaram que cada um desembolsaria R$ 100 mil, contou Vicente. Joel também prestou depoimento no caso e relatou que, inicialmente, foi contra, mas ficou com receio da represália - ou seja, o fim do contrato com a TV Icaraí. Veja acima.
Funcionária do setor financeiro do Grupo Malucelli entregou dinheiro em envelope para Plauto Miró
Combinado o pagamento, era preciso separar o dinheiro e conseguir notas frias para justificar na contabilidade a saída dessa quantia, aponta a investigação do MP. O serviço foi solicitado à Georgete Weber, funcionária que trabalhava na parte administrativa do Grupo Malucelli e era considerada pessoa de confiança de Joel.
Em depoimento, ela contou que entregou o dinheiro ao deputado Plauto Miró, que foi pessoalmente até a sede da empresa. Georgete também relatou que Vicente contou que pagou Traiano com cheques e precisava de dinheiro em espécie para cobrir o valor. Veja acima.
O que dizem os citados
Em nota, a assessoria de Ademar Traiano disse que o deputado "reforça a validade legal do acordo realizado e que os documentos veiculados estão sob sigilo judicial".
A defesa de Plauto Miró afirmou que o ex-deputado "reafirma que formalizou um acordo junto ao Ministério Público, o qual foi homologado pelo Poder Judiciário e plenamente cumprido por sua parte. Conforme a legislação em vigor, o assunto está encerrado".
A defesa de Joel Malucelli e do Grupo Malucelli disse que não vai se manifestar.
A equipe jurídica de Vicente Malucelli disse que, "por motivo de sigilo processual, não pode tecer maiores comentários. Contudo, ressalta que no acordo de colaboração, Vicente já cumpriu com suas obrigações e está comprometido apenas a ser futura testemunha de acusação, caso o MPPR ofereça denúncia contra os envolvidos. Ainda, registra-se que toda a atuação de Vicente foi pautada em ordens de superiores hierárquicos do grupo empresarial J. Malucelli".
A defesa de Georgete não respondeu, mas já afirmou que a participação dela nos fatos se limitou ao cumprimento de ordens.
Entenda o contexto
Em 2020, Vicente Malucelli fez uma delação premiada sobre os pagamentos.
Em depoimento, o empresário disse ao Ministério Público (MP) que fez as gravações porque estava se sentindo ameaçado por Traiano e afirmou ter feito os pagamentos porque tinha receio que os dois deputados encontrassem uma forma de prejudicar o contrato com a TV Icaraí, que atendia a Alep desde 2012. Na época dos pagamentos, se aproximava do fim o vencimento da prorrogação automática do contrato da empresa com o Poder Legislativo.
Em 2022, Traiano e Plauto admitiram ao Ministério Público que pediram e receberam propina. Em troca da confissão, para não responder criminalmente, eles assinaram Acordos de Não Persecução Penal (ANPP) e de Não Persecução Cível (ANPC) e receberam multas - que, somadas, passaram de R$ 743 mil.
Porém, o caso só se tornou público em dezembro de 2023, após reportagem da RPC e do g1, que tiveram acesso ao acordo. Na ocasião, uma liminar movida por Traiano impediu a veiculação da reportagem por cinco dias.
Atualmente, apesar de concluído, o caso está sob sigilo por determinação do desembargador Luiz Mateus de Lima, do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR).
Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Paraná, não há indicação legal ou motivos relevantes para a tramitação em sigilo, "uma vez que o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) já foi homologado e há interesse público a ser defendido, inclusive no que diz respeito aos desdobramentos decorrentes da confissão do crime de corrupção pelo chefe do Poder Legislativo em outras esferas".
"Independentemente da imposição de um sigilo absoluto aos autos, os direitos e interesses de terceiros podem ser preservados, como já evidenciado pela manifestação do Ministério Público do Paraná (MP-PR) e pela decisão anterior do Judiciário em referência ao caso de pedido de propina por parlamentares da Assembleia Legislativa do Paraná", afirma a OAB Paraná.
Como foram feitos os pagamentos
De acordo com a deleção de Vicente Malucelli, o próprio empresário fez os pagamentos para Traiano. O primeiro, segundo o delator, foi feito em um envelope com R$ 50 mil em espécie, dentro do gabinete do presidente.
A segunda parcela do pagamento, de R$ 50 mil, foi dividida em três cheques assinados por ele – dois de R$ 20 mil e um de R$ 10 mil. Estes pagamentos foram feitos em outubro de 2015, de acordo com a delação, no hall do prédio onde o deputado mora, em Curitiba.
Vicente disse que, para agilizar o pagamento, o deputado dizia que o empresário podia fazer o pagamento com cheques pessoais e que mandaria o dinheiro para um terceiro que ele se referencia como "Júnior".
"E ele insiste que 'pode me dar teu mesmo, eu boto na conta... posso nominar um cara lá de uma oficina'. Júnior o nome, uma coisa assim. Não se é exatamente esse o destino final, né?"
"E ele insiste que 'pode me dar teu mesmo, eu boto na conta... posso nominar um cara lá de uma oficina'. Júnior o nome, uma coisa assim. Não se é exatamente esse o destino final, né?"
Conforme o empresário afirmou ao MP, a segunda parcela do pagamento foi feita diretamente por ele e posteriormente ressarcida pela empresa da qual ele era diretor. O ressarcimento, segundo ele, foi feito por Georgete Soares Bender, na época funcionária do grupo que atendia ordens de Vicente.
Também foi Georgete, de acordo com Vicente, que fez os pagamentos ao então deputado Plauto.
Vídeos mais assistidos do g1 PR:
Veja trecho a trecho os depoimentos e áudios que explicam negociação de propina entre deputado Ademar Traiano e empresário
5|4